Processos de Workshop App Central
Jun 26, 2024
Não é novidade entre, designers e produteiros as dificuldades de se extrair insumos relevantes durante um processo de pesquisa de produto e descoberta: evitar vieses cognitivos, ter que justificar a importância de se dedicar tempo à pesquisa em lugares onde a cultura de UX não é muito madura. Vale ressaltar também que muitos de nós trabalhamos em startups, cujo ambiente caótico não é exatamente o mais adequado para seguir a cartilha de boas práticas de pesquisa e descoberta. Por conta disso, decidi compartilhar uma oficina enquanto atuei como Product Designer na Gabriel e que resultou na reformulação de vários pontos da nossa Central 24h, resultando na melhoria do desempenho dos nossos analistas e também a queda de alguns fios de cabelo da cabeça deles.
Pontapé Inicial
A grande ficha que impulsionou a decisão de fazermos uma oficina com os analistas da Central 24h foram resultados bem ruins em um teste de usabilidade que eu rodei usando o Maze para testar a inserção de uma nova funcionalidade ao aplicativo da Central 24h, que até então, tinha como ponto focal o nosso mapa com clientes e ocorrência.
Isso fez com que percebêssemos que estávamos colocando muita coisa dentro do mapa e que, muitas tarefas do dia a dia dos analistas na verdade não precisavam ter como ponto de partida a posição geográfica dos nossos clientes. E que precisávamos mudar.
Workshop em ambientes caóticos
Oficinas são legais. Elas são ótimas para mostrar para pessoas de outras áreas a maneira como designers de produto pensam e, quando bem-sucedidas, conseguem incutir a coisa do design focado no ser humano.
No entanto, mesmo quando a gente fala de processos ágeis como o Lean Inception e o Design Sprint do Google, existem circunstâncias onde simplesmente não há tempo para realizá-las. Infelizmente, esse era o caso.
Só que era imprescindível incluir as vozes do time de analistas, coletar as informações, validar (ou não) a hipótese levantada e gerar algo útil para os analistas (e consequentemente para a empresa). Eis o que fizemos:
Colocando o pessoal para desenhar
A oficina elaborada consistiu em 3 momentos distintos:
QUEBRA-GELO (10 a 15 minutos)
Assim como em entrevistas qualitativas, o quebra-gelo aqui é fundamental para deixar os participantes mais tranquilos. É muito importante explicar o motivo da oficina, a importância da opinião dos participantes, como ela vai ser realizada e sobretudo, deixar muito claro que não importa a qualidade do desenho e que tudo bem ela não “saber desenhar”. O que importa é a ideia contida no desenho. É muito importante frisar isso aos participantes porque embora o rabiscoframe seja rotineiro na vida de muitos produteiros e designers por aí, papel e lápis podem ser bem intimidadores para quem não é da área. Fazer um desenho bem simples para mostrar que não precisa ser um Picasso para participar ajudou bastante no meu caso.
HORA DO DESENHO (10 minutos)
Material necessário: papel A3 e lápis, caneta, pilots etc.
A parte legal. Cada participante (e isso obviamente inclui os organizadores) vai desenhar as soluções que ele imagina para os problemas mais recorrentes no dia a dia. Dependendo do seu caso, vale guiar os participantes usando o Crazy 8s, embora o volume de soluções geradas por participante não é o ponto e sim fornecer um meio rápido para ajudar a exprimir ideias.
TROCA DE IDEIAS (20 a 40 minutos)
Material necessário: papel, caneta, gravador ou algum dispositivo que permita o registro da conversa.
A parte mais legal ainda. Terminados os desenhos, cada participante agora explica aos demais o que ele fez e o porquê de ter incluído tal funcionalidade no seu desenho. É aqui que vão surgir soluções para problemas menos visíveis e até soluções de interface interessantes que você, designer / produteiro enviesado não tinha pensado antes. Fique atento para esses seguintes pontos:
a) Existem desenhos recorrentes?
b) Estes desenhos recorrentes possuem a mesma funcionalidade ou são casos de “evolução convergente”?
c) Existe um tópico abordado com frequência?
Aqui vale também estimular a troca de ideias entre os participantes: a solução gerada pelo outro ajudaria na resolução de algum problema do dia a dia? Existem outros problemas que poderiam ser resolvidos de maneira similar? Existem muitas possibilidades nessa etapa e, novamente, os participantes podem olhar os desenhos pensar sobre. Pode parecer bobagem, mas a nossa espécie tem um pedaço bem razoável do nosso cérebro dedicado ao processamento de informação visual e ter um material de suporte para pensar e analisar o que está sendo conversado ajuda bastante.
Organizando a informação coletada
Agora que você tem algumas horas de conversa registradas e alguns desenhos feitos, não esqueça de digitalizar os desenhos e transcrever o que foi dito durante as sessões
DIGITALIZANDO OS DESENHOS
Basicamente isso se resume a fotografar os desenhos e anotar o autor para que você possa comparar o que foi dito com o que foi desenhado.
Uma ação extra recomendada é, enquanto você ouve ou lê a explicação do desenho, usar o Figma Jam (ou ferramenta similar para organizar ideias como o Miro) para dar uma “limpada” no desenho original. A intenção é tornar o conteúdo mais compreensível para pessoas que não participaram da oficina. Nem sempre a letra dos participantes é super legível. Sempre deixe disponível um link ou cole os desenhos originais ao lado das versões limpas.
TRANSCREVENDO AS CONVERSAS
Dependendo do assunto, do entrosamento dos participantes e do quanto eles estão à vontade, surgirão tópicos que:
a) Não são relevantes ao assunto (e aí cabe aos moderadores a tentar evitar esse desvio de foco)
b) Tópicos contendo informações sensíveis dos participantes ou sobre parentes dos participantes (Privacy by Design, que é uma preocupação constante aqui na Gabriel)
E aí cabe aos moderadores da oficina a decisão de omitir ou não essas informações. No entanto, a ideia é sempre preservar ao máximo a privacidade alheia.
Transformando dados em temas
Agora que você possui um monte de desenhos e uma quantidade razoável de conversas gravadas e/ou transcritas, como fazer essa montanha de dados fazer algum sentido e de maneira relativamente rápida?]
saída que empregamos aqui foi usar análise temática, que é uma estratégia para reduzir os dados coletados através da segmentação em temas para que no final você consiga identificar os conceitos mais importantes do conjunto de informações iniciais.
Por questões de praticidade, optamos por uma codificação indutiva dos temas: juntando os desenhos produzidos e as transcrições das conversas, foi possível usar funcionalidades como temas. Alguns exemplos foram:
Buscar informações do cliente
Buscar informações sobre o histórico de atendimentos prévios de um cliente
Buscar informações do local de instalação das câmeras
Mosaico de câmeras
A importância do olhar crítico e cuidado na categorização temática
Como mencionado ali em cima, um tema recorrente nos desenhos produzidos na oficina foi o “mosaico de câmeras”. E olhando para trás, foi um erro ter criado essa categoria por dois motivos:
Um mosaico de câmeras em sim é uma solução para um problema específico ao invés de uma ação (por exemplo: visualizar várias câmeras ao mesmo tempo)
Ao ler as transcrições das conversas, ficou mais claro que o mosaico de câmeras, para nossos analistas, não tinha como principal funcionalidade conferir vários locais ao mesmo tempo ou coisa do tipo: o mosaico tinha como principal função a checagem de saúde das câmeras (ie: verificar se de fato estavam online ou funcionando corretamente) dos locais. Vide a citação abaixo.
“Uma coisa que Fulano já falou e realmente me faz falta é o mosaico. Cara: às vezes a gente tem 18 câmeras num local. Aí eu tenho que testar a disponibilidade da Live.”
Por conta disso, meu conselho é: não use a categorização temática apenas como ferramenta apenas para tagueamento de informações. Você e seus colegas precisarão de um pouco mais de contexto para poder transformar esses dados em algum tipo de conhecimento útil.
Recorrência de temas e priorização de melhorias
Agora que você definiu os temas, hora ver quais são os temas mais recorrentes?
Ao ter essa recorrência de maneira clara e visível, isso permitiu que:
a) Pudéssemos checar se a nossa hipótese inicial sobre a importância do mapa era verdade (no nosso caso a hipótese foi confirmada)
b) Tivéssemos clareza sobre O QUÊ diabos fazer para melhorar a vida dos nossos analistas
c) Pudemos também PRIORIZAR o que seria feito de acordo com a recorrência de cada tema encontrado na oficina.